[CHAMADA PARA DOSSIÊ] Dossiê “Racismos: corpos, políticas, cidades, poderes e dominações em tempos de ódios” - v. 12, n. 1, 2023
Dossiê “Racismos: Corpos, políticas, cidades, poderes e dominações em tempos de ódios” (v. 12, n. 1, 2023)
Nenhum corpo está a serviço
do poder do outro.
O meu, o nosso corpo protegido
é expressão de axé.
Da dádiva, da germinação.
Do sagrado, do divino.
Do cuidado, do amparo ancestral.
O corpo é expressão da vida.
Que jamais conspira.
Para que o corpo negro seja
um grão de areia.
Esquecido, pequeno, insignificante.
Sem território, sem alma
velado no chão.
Hélen Diogo[1]
O presente dossiê apresenta como proposta a produção do conhecimento, do diálogo e dos saberes com as múltiplas intersecções da temática Racismos, de modo a orientar pensares fora do eixo condutor da colonialidade do poder[2] e da dominação de corpos dóceis[3], superando as amarras do binômio colonizador-colonizado, o qual hierarquiza, subjuga, fragmenta e violenta, a bel prazer, as populações negras.
Não é demasiado pontuar que os racismos não se situam apenas em zonas de discussões individualizadas, pessoalizadas e unilaterais, mas ocupam territórios de disputa que questionam e chamam para o debate o campo relacional da branquitude, e da teia social, com o constructo raça e as produções de racismos como obra da modernidade.
A eloquência com que as lutas raciais ganham a internet, os jornais e a televisão sinalizam que os ecos do Black Lives (to) Matter são cada mais intensos e necessários, uma vez que não silenciam a perversidade do apagamento e dizimamento racial. Muitos questionamentos surgem, como: Quais vidas (negras) importam? Quando que os negros serão, de fato, livres? Quanto vale o corpo negro em uma sociedade hierarquizada e dinamizada pelo racismo? São infinitas indagações, as quais suscitam respostas ao nível da complexidade que orientam formas peculiares, ainda nos dias atuais, do Estado brasileiro, operar a gestão de corpos negros, e periféricos, em becos e periferias, separados, se possível, da cidade, dos direitos e das garantias, aniquilados da sua essência e existência.
Cumpre destacar que a ausência de políticas de Estado, de uma educação para as relações étnico-raciais, de uma pedagogia jurídica critica e antidiscriminatória diante da conjuntura posta, a qual flerta e incentiva comportamentos de ódio, sugere e clama por encaminhamentos que comungam com uma sociedade racista que precifica corpos racializados, admite-os na esfera do condicionamento, se possível, do trabalho braçal e de servilidade, descarta a humanidade e presença negra e os conjugam a uma imperiosa necropolítica[4], uma vez que a negritude age como um impeditivo de cidadania. A comunidade negra, apesar das dores ao longo da história, do alijamento racial que impede a vida física, material e simbólica, re-existe sem direito a uma chama do sonhar e do viver livre. Se a liberdade ainda é uma rota, um caminho a se encontrar, na mesma entoada está a dívida impagável[5] que o Estado está longe de quitar quando trata de equidade, justiça e dignidade da pessoa humana e negra.
Para tanto, complementa o tema central do Dossiê “Racismos: corpos, políticas, cidades, poderes e dominações em tempos de ódios”, os seguintes eixos:
- Ações Afirmativas
- Epistemologias Negras
- Filosofia e Saberes Africanos
- Feminismo Negro
- Literatura Negra
- Patrimônio Cultural Afro-Brasileiro
- Racismo Ambiental
- Racismo Institucional
- Racismo no Esporte
- Religiosidade e Matriz Africana
- Racismo algorítmico
- Outras formas apuradas de Racismos contra indígenas, ciganos e estrangeiros.
O prazo limite para a submissão dos artigos, resenhas, verbetes, entrevistas, intervenções artísticas é 15 de fevereiro de 2023.
Organizadores/as: Hélen Rejane Silva Maciel Diogo (PPGD/UFSC); Daniel Machado da Conceição (PPGE/UFSC); e Jefferson Virgílio (ICS-ULisboa).
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[1] Poética em Epígrafe in: DIOGO, Hélen Rejane Silva Maciel. Corpos, sobrevivências e o (des)enraizamento da colonialidade no contexto do novo coronavírus (SARS-CoV-2). Dossiê "Estratégias Decoloniais: perspectivas antirracistas e contra-hegemônicas", v. 4, n. 2, 2020. Disponível em: https://periodicos.furg.br/reis/article/view/12453 Acesso em 26 out 2022.
[2] QUIJANO, Aníbal. Dom Quixote e os moinhos de vento na América Latina. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 55, p. 09-31, 2005.
[3] FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, Vozes, 1987. 288p.
[4] MBEMBE. Achille. Necropolítica: Biopoder, soberania, estado de exceção, política de morte. São Paulo: n-1edições, 2018.
[5] FERREIRA da SILVA, Denise. A Dívida Impagável. Tradução Amilcar Packer e Pedro Daher. São Paulo: 2019.