O problema da consciência entre Sartre e Merlau-Ponty

Autores

Palavras-chave:

Consciência, Nadificação, Outrem, Sartre, Merleau-Ponty

Resumo

Das querelas de Sartre e Merleau-Ponty, delimitaremos a nadificação ontológica, contrastando-a ao projeto de uma consciência encarnada que não só atualiza a distinção entre “em-si” e “para-si”, mas encontra na percepção uma via pela qual as atitudes deliberativas são codependentes. Posto o problema da intencionalidade, para Sartre a consciência, além de suscitar um acesso ao Ser (ontologia), só pode ser o que é enquanto for consciência livre e posicional de algo. Vazia, ela é o “para-si” que, perante a realidade objetiva, possui um poder nulificante. Diante do Ser, ela é o Nada: o não-ser, o vazio, a liberdade que surge da negação do em-si quando, por atos interrogativos, transforma seu agir mundano em escolha existencial. Assim, ontologicamente falando, a consciência tanto dá significação ao ser enquanto objeto, quanto tende a tornar-se o único princípio constituinte do mundo; ideia esta que Merleau-Ponty atualiza. Com efeito, visto que o corpo é veículo de ser-no-mundo, em Merleau-Ponty o homem não é nem coisa, nem consciência puros. Aquém da dualidade do “em-si” e do “para-si”, delimita-se aqui a soberania da consciência sartriana para, disto, indicar um horizonte pelo qual os posicionamentos téticos expressam engajamentos de ser coabitados por outrem. Sensível entre sensíveis, o homem não é pura negatividade, mas dimensão que, encarnada, não se distancia de si para dizer sobre si ou projetar-se entre as coisas. Portanto, enquanto Sartre nos condena à vacuidade da consciência, Merleau-Ponty o atualiza, sugerindo: se, fenomenologicamente, Sartre suscita o inacabamento necessário à existência humana, metafisicamente, toma a mundaneidade como resultado de um ato deliberativo. Alegando que a consciência encarnada está sempre em situação, Merleau-Ponty assegura que somos concomitantemente autônomos e determinados, visto que nossa conduta só existe pelos olhos de outrem.

Biografia do Autor

Diego Luiz Warmling, Programa de Pós-graduação em Filosofia da UFSC (PPGFil UFSC)

Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina (PPGFil UFSC), com enfoque em psicanálise, fenomenologia e existencialismo. Ocupa-se com os diálogos entre a psicanálise freudiana e a fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty acerca de temas como a teoria das pulsões, a sexualidade e a corporeidade. Atualmente, também é coordenador do Grupo de Estudos em Filosofia Fenomenológica Francesa (GEFRAN UFSC), oferecido em ação conjunta entre o PPGFil UFSC e o Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC (PPGP UFSC)

Renato dos Santos, Programa de Pós-graduação em Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PPGFil PUCPR)

Possui Graduação (2014) e Mestrado (2017) em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), na modalidade de Bolsista CAPES. Atualmente, é doutorando em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e pela Universidade de Coimbra (UC) (cotutela). É autor do livro "O quiasma do mundo: a questão da alteridade em Merleau-Ponty" , publicado pela editora CRV (2017). Possui vários artigos publicados em periódicos especializados na área de filosofia, bem como capítulos de livros e apresentações de trabalho. É membro do grupo de pesquisa KAPHIPSI - Círculo de Filosofia, Metapsicologia e Terapia Psicanalítica, cadastrado no CNPq; e do GEP To Katholou - Metafísica Pós-moderna, ambos da Unicentro. Tem interesse por Ontologia, Fenomenologia, Existencialismo, Estruturalismo e Filosofia da Psicanálise. No que se refere aos temas de pesquisa, estes giram em torno da questão da alteridade, a questão do sujeito, a noção de estrutura, o fenômeno da existência e seus desdobramentos. Temas que são investigados a partir dos seguintes autores: Hegel, Husserl, Heidegger, Merleau-Ponty, Sartre, Camus, Lévi-Strauss, Freud e Lacan.

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Publicado

2020-02-03

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Artigos - Temático